terça-feira, 8 de novembro de 2011

A Sede & A Fome


Ele chegou em casa suado, cansado, e  estava faminto, mas a ansiedade em se conectar superava toda e qualquer sensação ou incômodo que pudesse ter depois de uma tarde cheia de tarefas de sua labuta diária. Na rua havia sentido a calça jeans suada grudar na sua pele das coxas, a camisa grudar no seu lombo suado.
Descia e subia ladeira carregando uma pasta com mais de 3 kg de papéis, livros, revistas e um talão de nota fiscal. 
Num bolso um celular, no outro um telefone portátil para ligações diversas.
Apesar de no início ter resistido em tirar a roupa e em se banhar, conteve a ansiedade,  foi tomar uma ducha refrescante. O seu corpo pedia , sua alma clamava.

Que delicia sentir a água fria descendo, lambendo sua pele, lavando, revigorando sua disposição. Um prazer indescritível. Ali, se sentiu totalmente novo. Alguém o apressava de lado de fora do banheiro. Não deu atenção às insistentes batidas na porta. 

Deliciou-se com a água como se fosse o corpo doce, da mais desejada amante. Sentia o frio da água com desmedido prazer, lambendo sua pele.
Tentou se conectar, mas o estômago reclamava algo para repor as energias perdidas com intermináveis ligações para clientes - chatos, e às vezes insensíveis aos seus apelos na compra pelos serviços oferecidos. Mas ele não desanimava, sabia que o setor de vendas é assim, mesmo. É para os fortes, os que nunca desistem. Ser persistente, teimoso - até a venda se concretizar. Vender é ter dinheiro nas mãos.
Meu Deus, o que vou comer, esqueci de comprar algo para fazer agora à noite - ele não comprava muitos mantimentos, era solteiro e vivia de refeições rápidas. Até mesmo seis ou oito fatias de queijo, com algumas de presento corriam o risco de mofarem penduradas no desprezo do seu apetite. Muitos pães criavam bolô, pendurados num prego ao lado de sua cama - esquecia de comê-los, comprava mais.
Mais de 30 minutos havia se passado, se quer lembrou que estava morrendo de sede. Era de praxe, logo que entrava em casa ir no bebedouro de plástico e beber um ou dois copos de água natural.
Por sorte, um irmão que havia chegado de viagem lhe perguntou : "tem uma sopa aí, quer..."
Sorveu a sopa com sofreguidão, acompanhada por um pão e uma xícara de esmalte, com café com leite. Observou que na xícara estava escrito: "não roube, o governo não quer ter concorrentes."

Banhado, alimentado- enfim, munido do seu notebook,com a bateria nas mãos, mais um conector projetado com as novas normas de segurança, com 03 entradas, ligou o notebbok, e aguardou os segundos eternos para aparecer a janela da sua operadora de internet. Você está conectado - um alívio.

Mais segundos eternos e de muitos clics para abrir o MSN. E, por fim, viu o quadrinho verde que indicava que ela estava on line. Clics nervosos, e o cumprimento : OI.
Ela, como de outrora, respondeu, com ar de deboche:
-Lá vem você de novo, minha nossa Senhora...Por favor...
- Você sabe que...
Antes que ele completasse, do outro lado, ela, feito vidente ja respondia, escrevendo a sua réplica:
-Já sei, aquela mesma história de sempre...
-Eu não me canso de dizer, mas é verdade, é sério...
-Sei, diz...
-Eu tenho sede de você.
Ele ficou aguardando, por alguns segundos, a réplica dela.
-Já te disse não sou essa água que você quer beber...
- Tenho ...
E, ela mais uma vez ja preparava a sua reposta, antes mesmo dele mandar a mensagem. Ela só obeservava os pontinhos que bailavam na sua janela do msn, indicando que ele escrevia.
- Pára com isso -, dizia ela , quer dizer, escrevia, em resposta antecipada.
-Tenho fome de você.
- Já te disse que não sou  dessa comida que você quer comer, além do mais, nem te conheço.
- É, não entendo, você me oferece uma página em branco todos os dias.
- Ah, tenho sede e fome de escrever...
-  Ligue sua can - pediu ele, com sofreguidão
- Não posso, estou sem roupa, tá calor aqui.
- Mas, as outras ligam  a can, justamente quando estão sem a roupa.
- Eu não...
Ele silenciou, viu que ela não digitava. Ele, com ares de reclame, escreveu:
- Caso existisse um restaurante de gente, você seria o prato mais espacial da casa e a bebida  mais sofisticada.
Ela mandou uma mensagem, dizia que tava às gargalhadas. Completou assim:
- E, você...
- Ia querer COMER e BEBER. 

Lá fora, a lua brilhava, iluminando  as nuvens que passavam num céu sem estrelas. O calor aumentava de intensidade, ela continuava abrindo e fechando páginas, lendo notícias e vídeos. As horas passavam e ele teclava com outras pessoas,amigas, amigos. Abriu e passava alguns emails. Quando ela retomou a conversa, a sua fome e a sua sede aumentaram de intensidade. para provocar, disse que abriu a janela, ligou o verntilador, mas não foi o bastante - havia tirado a calcinha - última peça que resistira a cobrir o seu corpo naquela noite infernal. Ele pediu:
- Ligue a can...
E, ficou longos minutos aguardando, aguardando,aguardando... Pediu uma pizza, da promoção que vem com dois refri de dois litros - estava com sede e muita fome, muita fome e muita sede.





































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